quarta-feira, agosto 13, 2014

Uma mãe sem filho e uma filha sem mãe

Olá, boa noite.
Cá estamos de novo… e com tanto para contar… que nem vai dar.
Como disse no último “post”, na sexta-feira partimos para o Longundo por um caminho desconhecido.
Graças a Deus o nosso guia não falhou e acompanhou-nos a partir do Seles. Já tínhamos percorrido 70 km. desde o Sumbe. Rumámos em direção à Catanda, daí para o Atóme, via da Chila e corte para o Longudo. Foram aos todo 80 km. de asfalto e 75 de picada, nuns sítios melhor, noutros nem tanto. Subimos montes, descemos vales, passámos por dentro de rios graças ao tempo seco em que nos encontramos, cruzámos pontes de paus e tábuas que por vezes fazem arrepiar. Das muitas aldeias por que passámos, todas parecidas, cada uma com o seu nome, ficou o de uma: Leiria. Terá algum conterrâneo nosso andado por ali?
Já perto do Longundo passámos pela Chinjamba, rodámos dentro da aldeia e até parámos para saudar as pessoas que vieram ao nosso encontro. Quando o sol já declinava no horizonte chegámos ao nosso destino, cerca de 7 horas depois de termos partido. À nossa espera um grupo de pessoas com batuques a cantar, dançar, bater palmas… a dar as boas vindas, momento que sempre emociona. Depois acompanharam o jipe com aquelas danças de ritmos tribais até à aldeia.
Foram-nos mostradas as instalações começámos a descarregar o jipe com a ajuda de algumas pessoas e o olhas atento e curioso das crianças com olhos bem arregalados de tanta coisa que saía daquela caixa metálica branca. Algumas das mais pequenas fugiam de medo e ficavam a ver-nos ao longe com olhar desconfiado. Ocupámos os nossos quartos e conhecemos a sala onde tomaríamos as refeições. Logo o avô Filipe se pôs a fazer uma sopa que nos soube muito bem. Nesse dia o cansaço era tanto que só deu para jantar, fazer alguns ajustes no programa da visita e fazer a oração da noite.
No sábado, depois da oração da manhã e do mata-bicho, distribuímo-nos pelas nossas tarefas: a Tânia nas consultas com o apoio das manas Joaninha e Teresa para a tradução e rastreio; o avô Filipe na cozinha, eu com as habituais reuniões com vários grupos da comunidade. A determinada altura a Teresa foi atender de cantina pois tínhamos levado sabão, sal, esparguete e lixívia, o que tínhamos disponível na altura. Como o dinheiro por ali é pouco, a maior parte das coisas foram vendidas à troca por milho.
No domingo tivemos a missa dominical na capela que tem paredes mas a que falta ainda o telhado. Estava muita gente e entre todos, um catequista que agora vive no Atóme e cuja presença me emocionou porque não o via há muito tempo e trazia vestida uma camisa que lhe ofereci em 1995, quando ele vivia no Gungo. Merecemos uma fotografia.
No domingo de tarde mais consultas, mais reuniões e uma lição de culinária para ensinar as pessoas a fazer sopa. Deu sucesso e muitos provaram a dita sopa que teve que ser comida diretamente do prato para a boa porque por ali não há colheres.
Entre muita coisa que aconteceu marcaram-nos duas situações em que nos implicámos. Uma grávida da qual a Tânia suspeitava que tivesse a criança morta no ventre (o que se veio a confirmar quando chegámos ao hospital do Sumbe) e uma bebé de 12 dias que a mãe e a irmã gêmea tinham morrido no parto e que praticamente não estava a comer nada.
Em vez da ginguba que queríamos comprar, trouxemos a mãe que ficou sem filho e a filha que já não tinha mãe e tem sido cuidada pela tia, mais duas crianças e uma cunhada. No tejadilho um cabrito “barreguento” que nos ofereceram no Caponte… mais bagagens, milho, ainda alguma ginguba… jipe a “abarrotar”.
À saída do Seles um polícia mandou-nos parar, mas o outro que estava à sombra na cadeira deu “instruções”: “esse aí é padre, saúda só e deixa seguir”. Recebemos um sorriso simpático, uma cara de admiração pelo local de onde vínhamos e votos de boa viagem. Como é mágica e bela a palavra “missionário”.
No Sumbe, mal chegámos a casa, eu e a Tânia partimos para o hospital noutro carro com os “casos” que trazíamos, enquanto o resto da equipa ficou a descarregar o “Cavalinho Branco”.
Ainda nessa noite a pequena “Quintinha” (porque nasceu à quinta-feira) tomou o primeiro alimento em vários dias (graças ao meu “xará” Vítor tínhamos em casa um biberon e leite próprio para recém-nascidos) e recebeu o nome daquela que pelo menos nestes dias muito a ajudou segurar a vida: Tânia!
Ontem tivemos a visita da simpática família Menezes (já falámos do Luís), que é da Maceira.
Neste momento o camião está carregado e, se Deus quiser, amanhã de manhã partiremos para a Donga para mais uma etapa de 10 dias.
Estamos juntos. Um abraço.

P. Vítor Mira

1 comentário:

Tio Serra disse...

Meu Deus obrigado por tudo quanto esta missão realiza.
Este episódio que o Sr. Pe. Vítor nos acaba de descrever é belo mas muito doloroso, a emoção é grande mas o homem também chora.
Quero dar graças a DEUS por a vossa viagem ter sido boa.
Amizade uma camisa com 19 anos, tal é o valor que lhe foi atribuído!
Bem a missão tem a força da ORAÇÃO, convido os meus amigos a rezar pelas missões e pelos missionários,
Parabéns á nossa futura médica Tânia que tem tido muito trabalho para ajudar na saúde dos doentes.
Neste dia dedicado a Nossa Senhora da Assunção, solicito a Sua interceção para a proteção do nossa missão e os seus missionários.
Um grande abraço.
Estamos juntos
Tio Serra